*André Justino
As eleições de 2014
mostraram uma nova face da política nacional e por que não dizer local. Como se
pode observar os debates seguiram caminhos menos pragmáticos. Os candidatos com
mais possibilidades de vitória postaram-se mais na crítica e desconstrução do
adversário e menos na apresentação de projetos, deixando o eleitor quase que
como um torcedor de time de futebol. Qual o seu pensamento a respeito disso?
Jornalista André Justino: Entendo
Magno, que as candidaturas majoritárias nestas eleições foram, na verdade,
extremamente pragmáticas, por isso mesmo faltou conteúdo.Faltou programa para
os candidatos a presidente, que tiveram um melhor desempenho eleitoral,
apresentarem para o nosso país e o nosso povo. Os debates que pautaram a
disputa ao executivo federal foram majoritariamente corrupção e escândalos.
A
disputa se deu majoritariamente entre iguais, que evitaram discutir a situação
agrária do país e a pauta indígena, mas não deixaram de ressaltar a
“importância” do agronegócio, que não trataram da geração, manutenção e
qualidade dos postos de trabalho, mas não faltaram afirmações sobre a
manutenção da atual política econômica, para o empresariado e os banqueiros. Que
em nada deram atenção as demandas que levou milhares de pessoas as ruas, no ano
passado, mas que apenas reafirmaram, Dilma, Aécio e Marina, que as mudanças
para o Brasil, tão faladas durante a campanha seriam aplicadas por meio dos
mesmos remédios de hoje.
Em uma disputa entre
iguais as diferenças são encontradas nos detalhes, e a exposição desses
detalhes rendeu ao eleitor um show de horrores, que de fato influenciou a
população pelo voto no menos ruim e não no melhor projeto para o país. Venceu a
Dilma, mas caso a vencedora fosse a Marina ou o Aécio, para o nosso futuro não haveria
muitas diferenças, o coração do governo federal está no seu projeto de política
econômica, e os três defenderam e ainda defendem o mesmo modelo político.
Em Pernambuco o PSOL conseguiu fazer um
deputado, o que evidentemente é enorme ganho para o partido no estado.
Nacionalmente a candidata Luciana Genro também conseguiu amealhar em sua volta
muitos simpatizantes. Finalmente o PSOL começa a trilhar um caminho que o fará
tornar-se a mais nova representação da esquerda nacional?
Jornalista André Justino: As eleições de 2014 representou, sem dúvida, uma derrota
para o campo de pensamento político historicamente identificado com a esquerda.
O PT, desde que chegou ao poder central do país, em 2003, mesmo garantindo sua
reeleição no cargo de presidência da republica pela quarta vez, teve sua mais
violenta derrota eleitoral, fruto dos descaminhos que o próprio partido tomou
para conquistar o poder a todo custo, por meio do vale-tudo eleitoral.
Foi já em 2004, que levou uma parcela significativa de militantes descontentes
com os rumos desse vale-tudo pelo poder, unir-se a quadros políticos de outros
partidos, além de agrupamentos políticos regionais e nacionais para construírem
outro caminho, um novo partido, que teria por objetivo não deixar as bandeiras
e o projeto de um país que invertesse as prioridades abandonadas. Dai surge o
PSoL, que nestas eleições foi o único partido da esquerda nacional que obteve
um bom resultado, extraído das urnas. A conquista disso se dá justamente pela
ousadia de não submeter-se aos encantos do caminho mais fácil, nossa candidata
a presidente do Brasil, a querida Luciana Genro obteve pouco mais de 1,6 milhão
de votos, todos conquistados pelo debate político, isso sem contar com o sentimento
de simpatia política que outros milhares tiveram com o programa do PSoL, mas
que optaram pelo voto útil.
Defender a inversão de prioridades significou nestas
eleições e ainda significa para o nosso país, defender a taxação sobre as
grandes fortunas, realizar a reforma agrária, reduzir a carga horária de
trabalho para 40 horas semanais, realizar a demarcação das terras indígenas, a
desmilitarização das PM’s e a descriminalização do uso da maconha, aplicar 10%
do PIB na educação e outros 10% na saúde, acabar com a política de superávit
primário e realizar uma auditoria dessa infindável dívida pública. Essas são as
mudanças que o país de fato precisa, mas que os “iguais” durante a campanha nem
de longe ousaram falar.
Esse não é o programa do PSoL, esse é parte de um programa
do bom senso, pela dignidade de nosso povo e de nosso país. É por defender esse
programa que o PSoL ampliou a bancada de deputados federais e duplicou a
bancada de estaduais.
A antecipação da campanha eleitoral de 2016
parece já estabelecida. O blog do Magno Dantas fez pesquisa de intenção de
votos onde o senhor apareceu em terceiro lugar com 21% para prefeito de São
Lourenço da Mata. Se o candidato André Justino conseguir manter esses
percentuais até as vésperas da decisão de sua candidatura oficial, o PSOL
poderia fazer alguma composição com um dos demais candidatos?
Jornalista André Justino: Primeiro. Não há ainda
candidato André Justino. Hoje existe o André Justino, filho, marido, pai,
jornalista e ativista social. Fico grato e responsabilizado pelos números
expostos na pesquisa, mas nem de longe quero perder o foco de que a disputa
social se dá também fora dos períodos eleitorais. Que o digam os moradores do
bairro de Penedo e Barro Vermelho, que vivem o cotidiano de boatos pelo fim da
linha de ônibus Camaragibe/Penedo, que o diga os moradores do Loteamento
Constantino, que convivem ainda com a falta d’água e o temor de novos
atropelamentos na BR408, que o digam os moradores do Parque Capibaribe com o
abandono das ruas esburacadas e o medo da violência que aumenta.
O muito que há de se fazer não dá para esperar as eleições de 2016 para serem
debatidos e solucionados. Não sou partidário da política do quanto pior melhor,
como fazem os simpatizantes das duas famílias que se revezam no poder a 50 anos
em São Lourenço da Mata. Assim, se é necessário que atuemos pela solução dos
problemas hoje, na gestão do PSB, que cobremos e conquistemos a solução.
Amo minha terra e afirmo com todas as letras, sou bairrista sim. E para cuidar
da terra que preso me recuso em aparecer de dois em dois anos, vestido seja lá
de que cor for para mentir desavergonhadamente para as pessoas. Na disputa
social sempre tive lado definido, com os feirantes do pátio da feira, que pagam
para trabalhar, com os professores da rede pública municipal, que vivem o medo
de uma gestão perseguidora, com os comerciantes da cidade, que pelos informes
que tenho também desejam o fim dessa falsa alternância do poder local.
E sobre a abertura para composições e relações políticas,
é da cultura do PSoL sempre estar aberto as relações com os atores e grupos
sociais que se dispuserem a compartilhar desse trabalho, que para nos dura o
tempo todo e não só nas eleições. Já as articulações eleitorais são sempre
consequências dessas lutas diárias.
Vamos falar sobre reforma política. Existe de
fato necessidade de uma reforma ampla nas práticas políticas no Brasil? Caso
sua resposta for positiva, quais seriam, em sua opinião, as mudanças mais
substanciais a serem realizadas?
Jornalista André Justino: Reforma Política é um tema que a muito vem sendo abordado
pelos políticos e que se continuar sendo abordado apenas pelos políticos,
continuará sendo por muito tempo, apenas abordado, mas sem sair do discurso. A
reforma que se discute são as necessárias mudanças das regras eleitorais do
Brasil, que hoje funcionam como um jogo de cartas marcadas, onde quem tem mais
dinheiro e prestigio se perpetua no poder. Há exemplo do PMDB, partido do
vice-presidente do Brasil, Michel Temer, e que desde o fim da ditadura na
década de 80 se firma com caciques eleitorais no poder, com José Sarney, Rennan
Calheiros, Jarbas Vasconcelos e outros.
Debater com seriedade essas regras significa atribuir ao
povo o seu protagonismo político, significa convocar a população para ela
opinar e dizer por meio de um plebiscito popular as mudanças necessárias, que
para mim, fundamentalmente consiste em acabar com o financiamento privado das
campanhas eleitorais, a implantação de votos por lista, a implantação de
dispositivo legal para a revogação de mandatos e a regulamentação definitiva da
instituição de plebiscitos e referendos para participação popular nas decisões
de ordem nacional, estadual e municipal.
O debate que se trava agora sobre como proceder a essas
mudanças, se por meio de plebiscito ou referendo é fundamental, pois reafirma o
exposto inicialmente. Ou temos povo envolvido diretamente nesse debate, dizendo
o que deve ser mudado ou não haverá mudança alguma. Assim, creio que plebiscito
seja o caminho, caso a presidenta do Brasil seda as pressões, abafando o tema
ou sucumbindo ao discurso de “prerrogativa do congresso” ela estará frustrando
até mesmo os votos úteis, que recebeu nessa apertada disputa eleitoral, da qual
saiu vitoriosa.
Recentemente o
congresso nacional negou à presidente Dilma a criação dos conselhos populares.
Isso não seria uma freada no processo democrático nacional?
Jornalista André Justino: Diferente dos inflamados discursos sobre bolivarianismo,
transformar o Brasil em Cuba, implantar uma ditadura comunista no país, o
dispositivo que trata dos conselhos populares, nada mais fazia que regulamentar
um mecanismo previsto já na Constituição Federal de 88, que o PSDB quando
esteve na presidência nunca pôs em prática e que o PT tratou de por mesmo com
todas as deficiências, sendo que agora o intuito seria regulamenta-lo, para não
mais deixasse de ser praticado.
Sabe aquele dito que fala: “No Brasil já tem muitas leis, o que falta é por
elas em prática”? É bem isso. Seria tirar do papel algo que a constituição
brasileira já previa.
E quem no meio da educação não já ouviu falar do Conselho do Fundeb, quem no
meio da saúde não já ouviu falar de Conselho Municipal de Saúde, ano passado em
São Lourenço da Mata foi realizada uma eleição para o Conselho Metropolitano de
Transportes Públicos. Esses conselhos já existem, eles garantem a participação
de pessoas comuns nas decisões públicas. O que os deputados do DEM, do PSDB, do
PMDB e outros fizeram o rejeitando foi evitar que o povo possa ter esse papel de
participar das decisões de governo.
Mesmo com a rejeição no congresso, a bancada do PSoL, que votou favorável ao
decreto, apresentou um Projeto de Emenda Constitucional que visa retomar esse
debate, porém com mudanças significativas como a autogestão dos conselhos e o
fim da indicação das presidências dos conselhos nacionais pelo governo.
Mudanças que garantem a independência dos conselhos, atribuindo-lhes maior
poder fiscalizador e promovedor de políticas públicas.
A reeleição de Dilma faz do Brasil um país
melhor ou representa a estagnação da democracia nacional?
Jornalista André Justino: Afirmei durante toda a campanha de segundo turno que Aécio
representaria um retrocesso para o país, obviamente não por Dilma ser melhor,
mas pelo fato de que as forças políticas por trás do Aécio representam tudo o
que o povo rejeitou ao dizer não à ditadura militar, nos anos 60, 70 e 80 e ao
dizer não para o PSDB no fim da era FHC, na década de 90.
O voto no Lula, em 2002, foi um voto na esperança de que o
país inverteria suas prioridades, rumo a uma soberania popular, por meio da
redução das desigualdades sociais e o que se vê na recondução do PT pela quarta
vez a presidência é que mudou a condução do Estado brasileiro,
com a ampliação de medidas sociais, o que antes não havia, mas que não passa
disso. Não há estratégia de redução das desigualdades sociais, os ricos
continuam aumentando seus faturamentos em detrimento ao aumento da receita dos
pobres.
O PT do Lula e da Dilma vem se reelegendo para administrar o sistema político
que rege e consome o país, não se mostram interessados em muda-lo ou supera-lo.
E essa prática obedece a limites políticos e históricos, governos como o da
Venezuela, Bolívia e Equador, que surpreendem ao se perpetuarem no poder, se
enxergam enfrentando hoje os limites históricos, mas travam a superação dos
limites políticos, pois tiveram coragem para junto ao povo enfrentar o poder do
sistema que historicamente consumiu as riquezas naturas e dos povos de lá.
Aqui no Brasil, com essa reeleição da Dilma, não resta alternativa para o PT se
não fazer o mesmo, parte significativa dos eleitores de segundo turno da Dilma
apostam nisso, trata-se de enfrentar esses limites políticos, do contrário,
além de não haver mais avanços com esse sistema, também não haverá mais futuro
para essa esperança, por meio do PT em 2018.
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