terça-feira, 11 de novembro de 2014

ENTREVISTA EXCLUSIVA: ANDRÉ JUSTINO/PRESIDENTE DO PSOL E SÃO LOURENÇO DA MATA


*André Justino

"O muito que há de se fazer não dá para esperar as eleições de 2016 para serem debatidos e solucionados. Não sou partidário da política do quanto pior melhor, como fazem os simpatizantes das duas famílias que se revezam no poder a 50 anos em São Lourenço da Mata. Assim, se é necessário que atuemos pela solução dos problemas hoje, na gestão do PSB, que cobremos e conquistemos a solução."




As eleições de 2014 mostraram uma nova face da política nacional e por que não dizer local. Como se pode observar os debates seguiram caminhos menos pragmáticos. Os candidatos com mais possibilidades de vitória postaram-se mais na crítica e desconstrução do adversário e menos na apresentação de projetos, deixando o eleitor quase que como um torcedor de time de futebol. Qual o seu pensamento a respeito disso?

Jornalista André Justino: Entendo Magno, que as candidaturas majoritárias nestas eleições foram, na verdade, extremamente pragmáticas, por isso mesmo faltou conteúdo.Faltou programa para os candidatos a presidente, que tiveram um melhor desempenho eleitoral, apresentarem para o nosso país e o nosso povo. Os debates que pautaram a disputa ao executivo federal foram majoritariamente corrupção e escândalos.

A disputa se deu majoritariamente entre iguais, que evitaram discutir a situação agrária do país e a pauta indígena, mas não deixaram de ressaltar a “importância” do agronegócio, que não trataram da geração, manutenção e qualidade dos postos de trabalho, mas não faltaram afirmações sobre a manutenção da atual política econômica, para o empresariado e os banqueiros. Que em nada deram atenção as demandas que levou milhares de pessoas as ruas, no ano passado, mas que apenas reafirmaram, Dilma, Aécio e Marina, que as mudanças para o Brasil, tão faladas durante a campanha seriam aplicadas por meio dos mesmos remédios de hoje. 


Em uma disputa entre iguais as diferenças são encontradas nos detalhes, e a exposição desses detalhes rendeu ao eleitor um show de horrores, que de fato influenciou a população pelo voto no menos ruim e não no melhor projeto para o país. Venceu a Dilma, mas caso a vencedora fosse a Marina ou o Aécio, para o nosso futuro não haveria muitas diferenças, o coração do governo federal está no seu projeto de política econômica, e os três defenderam e ainda defendem o mesmo modelo político.

Em Pernambuco o PSOL conseguiu fazer um deputado, o que evidentemente é enorme ganho para o partido no estado. Nacionalmente a candidata Luciana Genro também conseguiu amealhar em sua volta muitos simpatizantes. Finalmente o PSOL começa a trilhar um caminho que o fará tornar-se a mais nova representação da esquerda nacional?


Jornalista André Justino: As eleições de 2014 representou, sem dúvida, uma derrota para o campo de pensamento político historicamente identificado com a esquerda. O PT, desde que chegou ao poder central do país, em 2003, mesmo garantindo sua reeleição no cargo de presidência da republica pela quarta vez, teve sua mais violenta derrota eleitoral, fruto dos descaminhos que o próprio partido tomou para conquistar o poder a todo custo, por meio do vale-tudo eleitoral.


Foi já em 2004, que levou uma parcela significativa de militantes descontentes com os rumos desse vale-tudo pelo poder, unir-se a quadros políticos de outros partidos, além de agrupamentos políticos regionais e nacionais para construírem outro caminho, um novo partido, que teria por objetivo não deixar as bandeiras e o projeto de um país que invertesse as prioridades abandonadas. Dai surge o PSoL, que nestas eleições foi o único partido da esquerda nacional que obteve um bom resultado, extraído das urnas. A conquista disso se dá justamente pela ousadia de não submeter-se aos encantos do caminho mais fácil, nossa candidata a presidente do Brasil, a querida Luciana Genro obteve pouco mais de 1,6 milhão de votos, todos conquistados pelo debate político, isso sem contar com o sentimento de simpatia política que outros milhares tiveram com o programa do PSoL, mas que optaram pelo voto útil.


Defender a inversão de prioridades significou nestas eleições e ainda significa para o nosso país, defender a taxação sobre as grandes fortunas, realizar a reforma agrária, reduzir a carga horária de trabalho para 40 horas semanais, realizar a demarcação das terras indígenas, a desmilitarização das PM’s e a descriminalização do uso da maconha, aplicar 10% do PIB na educação e outros 10% na saúde, acabar com a política de superávit primário e realizar uma auditoria dessa infindável dívida pública. Essas são as mudanças que o país de fato precisa, mas que os “iguais” durante a campanha nem de longe ousaram falar.

Esse não é o programa do PSoL, esse é parte de um programa do bom senso, pela dignidade de nosso povo e de nosso país. É por defender esse programa que o PSoL ampliou a bancada de deputados federais e duplicou a bancada de estaduais. 


A antecipação da campanha eleitoral de 2016 parece já estabelecida. O blog do Magno Dantas fez pesquisa de intenção de votos onde o senhor apareceu em terceiro lugar com 21% para prefeito de São Lourenço da Mata. Se o candidato André Justino conseguir manter esses percentuais até as vésperas da decisão de sua candidatura oficial, o PSOL poderia fazer alguma composição com um dos demais candidatos?

Jornalista André Justino: Primeiro. Não há ainda candidato André Justino. Hoje existe o André Justino, filho, marido, pai, jornalista e ativista social. Fico grato e responsabilizado pelos números expostos na pesquisa, mas nem de longe quero perder o foco de que a disputa social se dá também fora dos períodos eleitorais. Que o digam os moradores do bairro de Penedo e Barro Vermelho, que vivem o cotidiano de boatos pelo fim da linha de ônibus Camaragibe/Penedo, que o diga os moradores do Loteamento Constantino, que convivem ainda com a falta d’água e o temor de novos atropelamentos na BR408, que o digam os moradores do Parque Capibaribe com o abandono das ruas esburacadas e o medo da violência que aumenta.

O muito que há de se fazer não dá para esperar as eleições de 2016 para serem debatidos e solucionados. Não sou partidário da política do quanto pior melhor, como fazem os simpatizantes das duas famílias que se revezam no poder a 50 anos em São Lourenço da Mata. Assim, se é necessário que atuemos pela solução dos problemas hoje, na gestão do PSB, que cobremos e conquistemos a solução.

Amo minha terra e afirmo com todas as letras, sou bairrista sim. E para cuidar da terra que preso me recuso em aparecer de dois em dois anos, vestido seja lá de que cor for para mentir desavergonhadamente para as pessoas. Na disputa social sempre tive lado definido, com os feirantes do pátio da feira, que pagam para trabalhar, com os professores da rede pública municipal, que vivem o medo de uma gestão perseguidora, com os comerciantes da cidade, que pelos informes que tenho também desejam o fim dessa falsa alternância do poder local.


E sobre a abertura para composições e relações políticas, é da cultura do PSoL sempre estar aberto as relações com os atores e grupos sociais que se dispuserem a compartilhar desse trabalho, que para nos dura o tempo todo e não só nas eleições. Já as articulações eleitorais são sempre consequências dessas lutas diárias.


Vamos falar sobre reforma política. Existe de fato necessidade de uma reforma ampla nas práticas políticas no Brasil? Caso sua resposta for positiva, quais seriam, em sua opinião, as mudanças mais substanciais a serem realizadas?


Jornalista André Justino: Reforma Política é um tema que a muito vem sendo abordado pelos políticos e que se continuar sendo abordado apenas pelos políticos, continuará sendo por muito tempo, apenas abordado, mas sem sair do discurso. A reforma que se discute são as necessárias mudanças das regras eleitorais do Brasil, que hoje funcionam como um jogo de cartas marcadas, onde quem tem mais dinheiro e prestigio se perpetua no poder. Há exemplo do PMDB, partido do vice-presidente do Brasil, Michel Temer, e que desde o fim da ditadura na década de 80 se firma com caciques eleitorais no poder, com José Sarney, Rennan Calheiros, Jarbas Vasconcelos e outros.

Debater com seriedade essas regras significa atribuir ao povo o seu protagonismo político, significa convocar a população para ela opinar e dizer por meio de um plebiscito popular as mudanças necessárias, que para mim, fundamentalmente consiste em acabar com o financiamento privado das campanhas eleitorais, a implantação de votos por lista, a implantação de dispositivo legal para a revogação de mandatos e a regulamentação definitiva da instituição de plebiscitos e referendos para participação popular nas decisões de ordem nacional, estadual e municipal.

O debate que se trava agora sobre como proceder a essas mudanças, se por meio de plebiscito ou referendo é fundamental, pois reafirma o exposto inicialmente. Ou temos povo envolvido diretamente nesse debate, dizendo o que deve ser mudado ou não haverá mudança alguma. Assim, creio que plebiscito seja o caminho, caso a presidenta do Brasil seda as pressões, abafando o tema ou sucumbindo ao discurso de “prerrogativa do congresso” ela estará frustrando até mesmo os votos úteis, que recebeu nessa apertada disputa eleitoral, da qual saiu vitoriosa.

Recentemente o congresso nacional negou à presidente Dilma a criação dos conselhos populares. Isso não seria uma freada no processo democrático nacional?

Jornalista André Justino: Diferente dos inflamados discursos sobre bolivarianismo, transformar o Brasil em Cuba, implantar uma ditadura comunista no país, o dispositivo que trata dos conselhos populares, nada mais fazia que regulamentar um mecanismo previsto já na Constituição Federal de 88, que o PSDB quando esteve na presidência nunca pôs em prática e que o PT tratou de por mesmo com todas as deficiências, sendo que agora o intuito seria regulamenta-lo, para não mais deixasse de ser praticado.


Sabe aquele dito que fala: “No Brasil já tem muitas leis, o que falta é por elas em prática”? É bem isso. Seria tirar do papel algo que a constituição brasileira já previa. 

E quem no meio da educação não já ouviu falar do Conselho do Fundeb, quem no meio da saúde não já ouviu falar de Conselho Municipal de Saúde, ano passado em São Lourenço da Mata foi realizada uma eleição para o Conselho Metropolitano de Transportes Públicos. Esses conselhos já existem, eles garantem a participação de pessoas comuns nas decisões públicas. O que os deputados do DEM, do PSDB, do PMDB e outros fizeram o rejeitando foi evitar que o povo possa ter esse papel de participar das decisões de governo.

Mesmo com a rejeição no congresso, a bancada do PSoL, que votou favorável ao decreto, apresentou um Projeto de Emenda Constitucional que visa retomar esse debate, porém com mudanças significativas como a autogestão dos conselhos e o fim da indicação das presidências dos conselhos nacionais pelo governo. Mudanças que garantem a independência dos conselhos, atribuindo-lhes maior poder fiscalizador e promovedor de políticas públicas.

A reeleição de Dilma faz do Brasil um país melhor ou representa a estagnação da democracia nacional?


Jornalista André Justino: Afirmei durante toda a campanha de segundo turno que Aécio representaria um retrocesso para o país, obviamente não por Dilma ser melhor, mas pelo fato de que as forças políticas por trás do Aécio representam tudo o que o povo rejeitou ao dizer não à ditadura militar, nos anos 60, 70 e 80 e ao dizer não para o PSDB no fim da era FHC, na década de 90.


O voto no Lula, em 2002, foi um voto na esperança de que o país inverteria suas prioridades, rumo a uma soberania popular, por meio da redução das desigualdades sociais e o que se vê na recondução do PT pela quarta vez a presidência é que mudou a condução do Estado brasileiro, com a ampliação de medidas sociais, o que antes não havia, mas que não passa disso. Não há estratégia de redução das desigualdades sociais, os ricos continuam aumentando seus faturamentos em detrimento ao aumento da receita dos pobres.


O PT do Lula e da Dilma vem se reelegendo para administrar o sistema político que rege e consome o país, não se mostram interessados em muda-lo ou supera-lo. E essa prática obedece a limites políticos e históricos, governos como o da Venezuela, Bolívia e Equador, que surpreendem ao se perpetuarem no poder, se enxergam enfrentando hoje os limites históricos, mas travam a superação dos limites políticos, pois tiveram coragem para junto ao povo enfrentar o poder do sistema que historicamente consumiu as riquezas naturas e dos povos de lá. 

Aqui no Brasil, com essa reeleição da Dilma, não resta alternativa para o PT se não fazer o mesmo, parte significativa dos eleitores de segundo turno da Dilma apostam nisso, trata-se de enfrentar esses limites políticos, do contrário, além de não haver mais avanços com esse sistema, também não haverá mais futuro para essa esperança, por meio do PT em 2018.

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