
A figura do capitão do mato surgiu na sociedade brasileira
por volta de 1694, após a destruição do Quilombo dos Palmares, com o intuito de
impedir a fuga de escravos e resgatar escravos fugidos. E ganhavam bem para
isso. O pagamento poderia ser em dinheiro ou até mesmo algum pedaço de terra.
Os senhores de engenho e outras autoridades da corte portuguesa, estavam
preocupados com o número cada vez mais crescente de seres humanos escravizados
querendo se libertar e resolveram criar uma espécie de política de segurança
pública da época. Tanto é que não seria nenhuma bobagem afirmar que a figura do
capitão do mato deu origem a policia militar, também criada ainda no período do
Império, em 1809.
O capitão do mato, em sua maioria, eram escravos libertos, o
que lhes dava uma falsa impressão de melhor posicionamento social e
superioridade pessoal sobre os demais. Claro que a escolha de escravos libertos
para policiar escravos não libertos foi proposital. É claro, também, que esses
escravos "promovidos" a capitães do mato fizeram por merecer tal
recompensa. Entregar a cabeça de seus pares, por exemplo. Pura meritocracia.
Trazendo para os dias de hoje, é como aquele seu colega de trabalho que puxa o
saco do chefe e cagueta a turma toda para subir na empresa. Digamos ainda que
para chegar a capitão do mato, o indivíduo tinha que ter um perfil evolutivo.
O neo liberalismo vive tentando produzir remakes dessa
personagem de nossa história. Pelé, mesmo não oficialmente, foi empossado no
cargo e como se comporta bem do jeitinho que a casa grande gosta, nunca perderá
sua Majestade. Tanto que ganhou o título de rei. O ministro Joaquim Barbosa foi
"sondado" para ocupar essa função, mas graças a Deus e a sua
inteligência acima da média, percebeu que estava sendo usado e declinou a tempo
do convite. Tudo parecia ir bem, mas quando ele declarou apoiar a política de
cotas, reconheceu resultados nas políticas afirmativas criadas pelo governo do
PT e se posicionou publicamente contra o impeachment de Dilma, a decepção foi
geral no reino de Dom João. Esse não serve mais! Precisamos de alguém com menos
personalidade, com mais necessidade de ascensão, sem muita estima as suas
origens e sem nenhum sentimento pelo sofrimento de seus antepassados.
Assim nasce Fernando Holiday. O capitão do mato do neo
liberalismo. A escolha do rótulo do produto é sensacional. Negro, pobre e gay.
Um legítimo representante das minorias exaltado pela direita conservadora,
sempre acusada de preconceito e de elitismo. Como somos injustos com eles. Só
que não! Não precisa raciocinar muito para perceber o que o jovem, coordenador
nacional do movimento Brasil livre, tem por missão.Enquanto acusa a esquerda de
promover uma divisão na sociedade, promovendo uma guerra entre classes, raças e
gêneros, a direita promove a divisão entre os próprios membros das classes, das
raças e dos gêneros. E eles são bons nisso.
Fernando Holiday publica vídeos cheios de atitude na
internet, grita, sapateia, esperneia, põe o dedo em riste para a câmera. Seu
discurso tem uma estrutura tucana, verbetes bolsonaristas e muitos
malafaiagismos. Já rasgou o hino à negritude em plena tribuna da câmara dos
deputados, já tentou desmoralizar Eduardo Suplicy, já se declarou contrário às
cotas raciais, já disse que Zumbi era um assassino e que preto gosta de se
fazer de vítima. Só faltou dizer que é branco. Talvez ele até acredite que
seja, pelo fato de ser o capitão do mato do momento, movido pela vaidade e
financiado por algum senhor de engenho preocupado com a perda de seus escravos
e empenhado em captura-los ou recuperar alguns, através da lei da oferta e da
procura.
Quando Holiday diz que os negros não precisam de favores ou
de cotas e devem conquistar os seus objetivos apenas por mérito, ele não está
querendo dizer que você pode e basta lutar. Na verdade ele apenas reproduz o
discurso dos racistas, que de maneira inteligente, usam um negro para conter os
outros descontentes, fazendo-os crer que toda luta por igualdade e respeito não
passa de uma bobagem, afinal, somos todos iguais, as oportunidades são iguais e
racismo é coisa da cabeça de gente complexada e incapaz. Ao mesmo tempo em que
é "vendido" como o preto exemplar ou negro de alma branca, Fernando
Holiday se submete ao que há de mais deprimente para a honra de um homem.
A sua eleição para a câmara dos vereadores de São Paulo, foi
um prêmio à sua fidelidade canina a agenda golpista e uma tapa na cara dos
movimentos esquerdistas. Uma forma de a direita conservadora dizer, falsamente,
vinde a mim todos os pretos, pobres e outras minorias, e eu vos elegerei. Não
temos nada contra vocês! Desde que estejam ao nosso lado. Desde que adotem o
nosso discurso. Jesus Cristo também fora tentado de forma semelhante quando o
diabo o levou ao topo de uma montanha e de lá, apresentando as belezas do seu
reino, o propôs abandonar os seus e a sua missão, em troca de toda a riqueza e
status que ele poderia lhe oferecer. Vai ficar nessa de lutar pelos pobres,
pelas minorias e de ficar pregando justiça e igualdade social? Os ricos vão te
odiar e os poderosos vão pedir a sua cabeça. Sai dessa! Eu tenho coisa melhor
pra você. Como Jesus não era golpista e muito menos se esquecia de suas
origens, seguiu em frente. Sai diabo!
A direita sempre contra ataca, e na maioria das vezes, o
intuito é retroceder. Trazer o país que eles acham que é só deles, de volta.
Quando os mais pobres começam a ter acesso à educação superior, eles cortam os
investimentos. Quando as mulheres conquistam independência, eles dizem que elas
devem ser belas, recatadas e do lar. Quando os negros e pobres decidem lutar
por igualdade e respeito, sem hipocrisia e falsa meritocracia, eles apresentam
Fernando Holiday. Essa postagem em sua página do Facebook, talvez diga alguma
coisa:
"Como Vereador, lutarei para:
- Combater o vitimismo:Todos, independente de cor de pele, podem alcançar o sucesso
sem precisar de migalhas do Estado para isso.
- Acabar com as cotas raciais em concursos públicos
municipais:
Chega de segregacionismo institucionalizado. Todos somos
iguais!
- A revogação do dia da consciência negra em São Paulo:
É um absurdo que exista uma data como esta, e que acima de
tudo, homenageie um homem assassino escravagista."
É a personificação do padrão meritocrata dos golpistas. Ou
seja, só está lá porque pensa como eles, age como eles, se sente como eles e
gostaria de ter nascido como eles. Mas sabe que nunca será de fato, como eles.
Será sempre visto como um agregado social, que deve favores aos seus senhores e
mentores. Exagero? Ele que ouse a contrariá-los.
Até lá, ele seguirá como paradigma da elite para ilustrar
como deve ser e se comportar, os pobres e os negros desse país, para serem bem
aceitos pela casa grande. Ele é realmente um fenômeno. É negro e não sofre
racismo. É pobre e é bem vindo à alta roda. É gay e agrada aos radicais
conservadores da direita. Já prevejo um globo repórter especial com a
tradicional chamada de Sergio Chapelin dizendo: quem é, onde vive, do que se
alimenta e qual é o segredo de Fernando Holiday? Que não é feijão, mas se tornou
o preto mais querido de alguns brasileiros.
Dez entre dez golpistas o preferem. Feijão, quer dizer,
Fernando Holiday, tem gosto de festa, é melhor e mal não faz aos interesses dos
senhores de engenho da nova era. E ainda combate o vitimismo. Oi?
Que não sirva de exemplo a resistência.
"Libertei mil escravos. Podia ter libertado mais mil,
se eles soubessem que eram escravos." Harriet Tubman.
Fonte: Neggo Tom/Brasil 247
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