sábado, 21 de março de 2015

Congresso já ameaça derrubar itens da MP das dívidas dos clubes


Ivo Lima/ME

Mal editou uma medida provisória para renegociar as dívidas dos clubes, o governo federal já estuda a próxima jogada: convencer o Congresso a manter os itens mais polêmicos do documento que pretende modernizar o futebol brasileiro. Em tempos de crise na relação do Executivo com o Legislativo, tudo indica que o trabalho não será fácil, pois dirigentes de clubes e parlamentares, principalmente os da Bancada da bola, se mostram contrários a três pontos da MP. Antes mesmo de o texto deixar o Palácio do Planalto e chegar ao “outro lado da rua”, as promessas são de emendas.

Na cerimônia de anúncio da MP de renegociação das dívidas, na manhã desta quinta-feira, no Planalto, a presidente Dilma Rousseff, o ministro do Esporte, George Hilton, e o pentacampeão Dida relembraram, assombrados como quase todo torcedor brasileiro, o amargo 7 x 1, que eliminou o Brasil da Copa no próprio país. O discurso dos três apontou para um novo momento, no qual o futebol nacional encontraria bons caminhos diante das contrapartidas exigidas pelo reparcelamento dos débitos dos clubes. Para isso, porém, ainda é preciso se defender do contra-ataque de outros “alemães”.
Três pontos da MP — que prevê o pagamento dos débitos em até 240 meses e com redução de juros — são questionados por dirigentes e deputados. A obrigatoriedade de investimento no futebol feminino, a limitação de 70% da receita bruta anual gasta com folha do futebol profissional e a mudança de estatutos de clubes e entidades organizadoras de competições — para permitir apenas mandatos de até quatro anos com uma única recondução — constam como os principais pontos de divergências e protestos (veja a lista de contrapartidas no quadro ao lado).

Com o jeito efusivo que lhe é comum, o deputado Andrés Sanchez (PT-SP), ex-presidente e atual superintendente de Futebol do Corinthians, afirmou que apresentará várias emendas à medida provisória das dívidas. “O dirigente tem de ter a liberdade de gastar com o que acha melhor”, justificou acerca de um dos itens.

Sobre a limitação de mandatos, o problema óbvio nos bastidores é que atingiria a organizadora do Campeonato Brasileiro. Mesmo o presidente do Flamengo, Eduardo Bandeira de Mello, que instituiu a limitação no time rubro-negro, não sai em defesa do enquadramento da Confederação Brasileira de Futebol. “É um debate que não cabe aos clubes, é um dever de casa do Congresso”, blindou-se. Entre os parlamentares, o discurso ensaiado há tempos é de que a medida seria inconstitucional. A possibilidade de os times abandonarem a entidade e formarem uma liga também é descartada.

Futebol feminino

O terceiro ponto em que falta consenso e sobram “ameaças” de retirada do texto, por votação no Congresso, se refere a um percentual, a ser definido, de investimento no futebol feminino. Para o deputado e membro do Corinthians, que considera a MP “85% boa”, não há jogadoras suficientes. A volante Carla Índia, que representou o movimento dos atletas Bom Senso ao lado de Dida e Cafu, discorda e mostra uma solução. “A gente enxerga como um pouco de preconceito e um pouco de preguiça. Há clubes que são exclusivamente femininos e conseguem se sustentar. Então, é um pouco de boa vontade com uma boa estratégia de marketing”, opinou. Desconfiada de como o embate será travado no Congresso, ela tentou se apegar às promessas de Dilma. “A ênfase que a presidente deu (para causa) é muito importante. Seria complicado eles mexerem”, ponderou.

De fato, Dilma deixou claro que pretende cobrar as contrapartidas ao reconhecer que “o refinanciamento será bastante facilitado”. Pelos 20 anos que os clubes terão para pagar o que devem, a presidente espera um “esforço”. “Eu assumi com a nossa campeã Marta (...) o compromisso de apoiar o futebol feminino para romper com a precariedade hoje vigente. Promessa que eu espero estar sendo cumprida da minha parte, mas que todos nós temos de nos esforçar”, enfatizou.

Questionado sobre os riscos declarados de itens importantes da MP serem retirados pelo Congresso, o ministro do Esporte, George Hilton, reconheceu que o governo terá de trabalhar para barrar a tentativa. “Existem, sim, parlamentares que defendem determinados pontos de vista e que a gente respeita. Vamos respeitar o Congresso e as discussões, mas vamos fazer também um trabalho de convencimento junto aos líderes (da Câmara e do Senado) para que mantenham, para aprovar o texto completo”, comentou sobre a estratégia para não enfraquecer o texto.

O que diz a MP

Em troca de um reparcelamento de dívidas com redução de juros e prazo de até 240 meses, veja o que pede o governo:

1. Publicação de balanço contábil padronizado após auditoria de empresa independente;

2. Pagamento em dia de todas as obrigações tributárias, previdenciárias, trabalhistas e contratuais com atletas e funcionários, incluindo direito de imagem;

3. Limitar o máximo de gastos com a folha do futebol profissional a 70% da receita bruta anual;

4. Manter investimento mínimo em categoria de base e no futebol feminino;

5. Não antecipar receitas para além do mandato, exceto no limite de até 30% da arrecadação referente ao primeiro ano do mandato seguinte e para casos de passivos onerosos;

6. Reduzir progressivamente o déficit do clube, a ser zerado até 2021;

7. Participação de clubes somente em campeonatos cujas organizadoras tomem as seguintes medidas:
- Limitação de mandato de quatro anos e única reeleição
- Publicação de prestações de contas padronizadas, sob auditoria independente
- Previsão de punições da MP* nos regulamentos e cobrança de CND (Certidão Negativa de Débitos)
- Participação de atletas nos colegiados e na eleição de cargos da entidade
- Responsabilização de dirigentes em caso de gestão temerária

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