Por Marco ALBANEZ*
Sincera
e francamente, não tinha a menor intenção de abordar o assunto em foco. Após
uma ausência de 15 dias no Blog do Magno Dantas, iria falar, no
primeiro artigo do ano, sobre a perspectiva política para este ano. Mas,
todavia, porém, aliás, a propósito, na realidade, outrossim, de maneira tal, do
mesmo modo, igualmente, por outro lado... resolvi dar uma guinada de 360º,
mandar a política partidária para o “Inferno II” – sim, porque no inferno ela
já está desde que Pedro Álvares Cabral fez a besteira de descobrir o Brasil e
piorou quando Dom Pedro I, “a beira do rio Capibaribe”, deu o grito de
“Independência ‘e’ Morte” – e falar de um tema que me assusta, me revolta, me
decepciona, enfim, me deixa triste, angustiado e aflito, tanto pelas causas
como principalmente pelas suas consequências. Estou falando do depravado e
insensato sistema de saúde do país que está podre, corrompido e em estado de
coma. E não venham dizer que não existem culpados e vítimas. Os
“protagonistas”? A maioria dos governantes irresponsáveis, cínicos, assassinos,
salafrários, bandidos, canalhas... que não têm o menor remorso ao surrupiar o
dinheiro público sabendo que ele poderia salvar milhares de pessoas, as quais
não carregam uma cruz nas costas, mas sim o suplício de não encontrar vaga em
hospitais públicos, médicos para atendê-las, leitos para interná-las e remédios
para tratá-las.
Aliás, pediria desculpas aos meus “sete leitores” fiéis caso a
cronologia dos fatos não caminhem em passos certos. Não deveria escrever
“soletrando números” e muito menos “somando letras”, mas o que tenho
presenciado – muitos casos in loco –
no que diz respeito à saúde pública no Brasil é de uma tristeza e de uma
revolta que não dá samba. A Constituição
de 1988 criou o Sistema Único de Saúde (SUS), cujos princípios são a
Universalidade, a Equidade e a Integralidade da atenção à saúde. No entanto, é
preciso tentar entender o que isto tudo significa. Em outras palavras, trata-se
de um sistema que tem como fundamento a acessibilidade da população ao
tratamento médico, haja vista que ele é financiado a partir dos impostos pagos,
direta e indiretamente, por todos nós. Na verdade, teria que ser, mas não é.
Pergunto: como estão funcionando os postos de saúde Brasil afora? Recentemente,
fiscais dos Conselhos Regionais De Medicina saíram em busca dessa resposta.
Visitaram mais de dois mil desses postos, em centenas de municípios. A situação
é alarmante. Em muitos municípios não há, sequer, metiolate e esparadrapo para
fazer-se um curativo. Falta vacina, falta remédio, falta equipamento, falta
médico, falta atendente. Falta até estrutura. É essa a triste realidade que
milhões de brasileiros enfrentam todos os dias. Além da área de informática,
eles também enfrentam a “era da conjuminância”, pois nada dá certo. Exemplos?
Vou dá-los – no primeiro, omitindo os nomes para que ninguém venha insinuar que
esteja me aproveitando deste espaço para fazer política ou demonstrar que sou
um “santinho”. Não, não sou. Sou o “cão chupando manga”. Corram!
Há quatro anos, fui picado por um inseto no pé esquerdo. No dia
seguinte, o inchaço era estarrecedor. Como todo brasileiro é médico, fui à
farmácia e comprei uma pomada anti-inflamatória. Não resolveu. Preocupado
(tenho Plano de Saúde), fui ao Hospital Português e o médico olhou o pé – sem,
sequer, examiná-lo –, passou uma outra
pomada e me mandou lavar a ferida com sabão amarelo. Pqp, me ferrei – pensei. (É
que o sabão amarelo tem soda cáustica, o que é um veneno para esse tipo de
infecção – causada por bactérias como alguns “humanos” que têm como habitat o Congresso Nacional, as
assembleias legislativas, as prefeituras, as câmaras municipais.) Não utilizei
o sabão, mas a pomada, sim. Nada de melhora. Meu pé parecia uma “pata” de
elefante. No terceiro dia, fui ao Hospital Memorial São José, exatamente às 19h
do dia 24 de dezembro, véspera do “Feliz Natal”. O médico examinou o ferimento
e nem pensou muito: determinou meu internamento, pois já estava com problema de
circulação e dele poderia surgir até uma amputação. Pirei. Como tenho dois
sobrinhos médicos, pedi a um deles – que tinha consultório no hospital – que me
arranjasse o melhor médico angiologista (vascular) e de sua confiança para me
examinar. No dia seguinte – 25, sim, um feliz natal para mim –, às 7h, o médico
estava me examinando (hoje, um dos meus grandes amigos, conforme vocês verão nos
exemplos adiante). Com cinco minutos, determinou a coordenação do hospital que
preparasse um bloco cirúrgico, pois seria anestesiado a fim de que fosse
possível fazer a raspagem do “cascão” do ferimento. Chamei-o e disse: “Doutor,
esqueça a anestesia. Pode fazer o tratamento aqui mesmo. Agora”. Surpreso, ele
me disse que não aguentaria e que poderia desmaiar. Insisti. Concluídos os
preparativos, uma das minhas duas filhas segurou meu braço esquerdo; minha irmã
mais velha, o braço direito; não me recordo quem, a minha cabeça; e colocaram
uma toalha na minha boca. Iniciada a raspagem, a dor era tamanha que os
segundos pareciam horas. (Urinei por causa da dor. Precisa dizer mais alguma
coisa? Não importou: queria ficar curado.)
Concluído o tratamento (meu pé parecia uma “picanha” crua), o médico
olhou para mim e disse que “nunca tive um paciente nessa situação com tanta
coragem”. Não era coragem. Eu precisava ter vida. Com curativos diários (a
pomada cicatrizante era importada e só os hospitais tinham ela), minha
recuperação estava excelente e por isso fui “expulso” do hospital no dia 31
(que réveillon!), pois o médico temia
infecção hospitalar (por 15 dias, continuei o tratamento em casa).
E os exemplos? Vamos ao primeiro – dois casos.
Juvenal (nome fictício) mora na Várzea Fria e tinha levado um corte na
perda (numa pedra). Foram semanas, meses indo para os hospitais Petrolina
Campos e Getúlio Vargas. Ninguém resolvia nada e quando tinha médico que
“conhecia” do assunto, aviava Bezetacil. Ele deve ter tomado umas 30 injeções.
Tentava marcar consulta com um angiologista pelo SUS e só havia vaga com seis
meses de espera. Seu sofrimento era imensurável. Não podia trabalhar e não
recebia o benefício do INSS porque os peritos estavam em greve. Quando tomei
conhecimento da situação, dei-lhe um esporro por não ter me avisado já que o
conhecia desde 1988 e sua família sempre havia votado em mim ou nos meus
candidatos. Ele não tinha Plano de Saúde e estava praticamente sem poder andar.
Não pensei duas vezes: liguei para o meu médico (sim, aquele que cuidou de mim)
numa quinta-feira. Mesmo de férias, marcamos no sábado seguinte no Hospital da Restauração, onde ele estaria de plantão. Chegando lá, o médico
examinou e disse: “seu caso é diferente do de Marco. Você tem uma varize que
está dificultando a circulação. Faça esse exame e no sábado me traga o
resultado”. No dia marcado, após ver o exame, foi logo marcando a cirurgia da
varize, realizada dois dias depois e recebendo alta com 24 horas. Tomou
antibiótico por sete dias e hoje está curado.
O outro caso foi mais emblemático. Zezinho (igualmente, nome fictício),
residente na Vila Ersina Lapenda, levou um corte na perna e achava que “era
simples” resolver. Mal podia caminhar. Nada de médico. Nem de hospitais. Como
Juvenal, os médicos só passavam Bezetacil. A situação chegou a tal ponto que
ele entrou em desespero. Pior: a ferida virou úlcera. Numa determinada noite, o
médico Jairo Pereira liga para mim e conta a situação e diz que tem colegas
angiologistas, mas gostaria que eu fizesse o que fosse possível para que “meu”
médico pudesse examiná-lo. Fui conversar com Zezinho e vi que a situação era
crítica. Como Jairo se prontificara em dar todo apoio logístico (o carro de
Bruno ficava a disposição para levá-lo e trazê-lo tantas vezes fossem
necessárias, para qualquer lugar) e os medicamentos ser-lhe-ia entregues,
liguei para o “meu” médico e marcamos a consulta para o dia seguinte, também no
HR. Ao ser examinado, o médico deixou bem claro: a amputação seria coisa de
poucos dias, caso não iniciasse logo o tratamento com antibióticos e a utilização
de uma “bota” clínica (não me pergunte o porquê ou para que ela serve, pois não
saberei responder). Durante um mês, Zezinho ia todo sábado ou terça-feira mudar
a bota e ser reexaminado. Quase todos os dias o médico ligava para mim dando
notícias. Está curado.
Impressionante, não? Duas pessoas sem plano de saúde, gravemente
enfermos, hoje estão contando historia com uma cura obtida no Hospital da
Restauração e com a assistência médica de um profissional com vínculo
empregatício no Estado, mas de renome nacional e com seu consultório –
particular – lotado todos os dias, localizado no Hospital Esperança. Esse
médico tem vocação e devoção pela profissão. Alguma dúvida? E porque alguns
outros profissionais não agem assim? Ganham pouco? Tem seis, sete ou oito
empregos para dar conta? Pois é, vê-se que se trata de uma questão de juízo de
valor.
Como elas, existem histórias reais e
comoventes que poderiam e deveriam ser rotineiras se os desgraçados de alguns
governantes não fossem germes que ocupam cargos públicos, a começar do governo
federal que fica divulgando que “o sistema de saúde está ótimo e atendendo a
população da melhor maneira possível”. E os governos estaduais? Estão
acompanhando o que está acontecendo no Rio de Janeiro? Imaginem o que acontece
no Acre, no Amapá, em Roraima... Governos municipais? Com raríssimas exceções,
os prefeitos não passam de pilantras. Certa vez escrevi um artigo intitulado “Os Bandidos do Colarinho Branco”. Fui
criticado bastante, mas os elogios superaram as críticas, apenas porque
afirmei, em sentido figurado, que uma pessoa matar outra é lamentável, é
triste, é inaceitável. Mas quantas pessoas morrem nas portas dos hospitais por
falta de assistência médica porque os políticos corruptos roubam o dinheiro que
deveria ser aplicado no sistema de saúde e, assim, salvar milhares de vidas? (Esse
meu artigo – fiquem sabendo agora – foi motivo de uma aula no Curso Fundamental
II de uma escola de referência da cidade de Olinda.)
Prestem atenção: uma pessoa que não tem plano de saúde espera seis meses
para marcar uma consulta. Se ele tiver sorte, o médico estará no consultório no
dia marcado e mesmo sem examiná-la, solicita uma série de exames. E lá vão mais
seis meses para fazer os exames requisitados (desde que os aparelhos não
estejam quebrados ou os servidores não estejam em greve). Observem que entre a
marcação da consulta e o atendimento médico, a demora foi de um ano. Ao receber
os exames (sem a menor confiabilidade), a pessoa tenta voltar para o médico e a
espera, mais uma vez, é de seis meses, em média. Se ela ainda não morreu, o que
poderá acontecer se surgir outra doença? Como explicar mulheres grávidas
procurarem três, quatro, cinco hospitais para ter seu bebê e termina vendo o
seu filho nascer no chão? Como aceitar que as bactérias fantasiadas de
políticos roubem o dinheiro de um sistema de saúde no qual existe mais fraudes
do que profissionais para atender a população? Como explicar que alguns –
principalmente – prefeitos “comprem toneladas” de remédios, faturem a sua
propina e os postos médicos continuem sem atender a quem precisa? É justo isso?
(Este é o outro exemplo.) Se alguém acha que tudo isso está certo, “parabéns”.
Se outros não concordam com essas safadezas, ótimo. Aproveitem e mandem alguns
políticos para um caminho sem volta nas próximas eleições municipais e, depois,
nas estaduais e federal.
Eu, particularmente, desejaria ver esses vagabundos e ladrões da
consciência do povo num paredão. De fuzilamento. Aliás, por mais que queira
contestá-lo, não encontro argumento. Estou me referindo à opinião de “Seu Tonho
do Jenipapo”, cabra-macho da peste, morador de zona rural e que anda muito puto
da vida com o que está acontecendo no país. Embora nunca tenha frequentado uma
escola, a sua revolta com o falido sistema de saúde no Brasil têm-lhe dado
coragem para “tocar na ferida” desses marginais ao dizer que
“Para que o caos na saúde pública termine de vez, é
necessário que os membros dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário
recorram ao SUS quando necessitarem de atendimentos médico e hospitalar.”
*Marco ALBANEZ
É
advogado (OAB-PE nº 7.658) e jornalista (AIP nº 2.163 e DRT/PE nº 3.271)
Gostei, Marco. O Brasil está doentio, deitado no chão dos hospitais, postos de saúde...sem remédio...Novo remédio: CPMF.
ResponderExcluirBom dia! Parabéns por seu comentário, sou assalariado não tenho plano de saúde e condições de pagar se necessário consulta particular.Onde moro temos um belo hospital, com funcionários exemplares,postos de saúde com ótimo atendimento, mas a carro chefe que é o hospital está faltando tudo, culpa de nós mesmos, ao nos deixarmos ser iludidos por políticos corruptos que fizeram da politica a forma mais fácil de nos roubar. Espero que o povo tenha acordado com que o Juiz Sérgio Mouro e equipe vem mostrando. Que em cada Município, cada canto deste Brasil apareçam outros. Mais uma vez, você foi muito feliz no tema abordado, tive que copiar e postar em minha página no Facebook.
ExcluirGrande Marcão,
ResponderExcluirEstava lendo seu artigo no exato momento que o NE TV falava da greve dos peritos (médicos) do INSS que estão de greve desde o final de Agosto, e um filho da puta (médico) em entrevista, quando perguntado pela repórter como ficava a situação das pessoas em geral, dizia que o povo deveria ter mais paciência. É phoda !! Conheço um que está sem receber há mais de 6 meses porque nem a empresa paga nem o INSS paga por que não se fez a perícia e o cara ainda está sem poder andar por causa de fratura exposta de fêmur em atropelamento.
Lendo a questão da sua raspagem a cru, me lembrei de caso o corrido comigo em 2013.
Fiz uma operação de hidroceles (acho que o nome é este) com Aureliano Cordeiro, médio de larga experiência. Temendo Infecção hospitalar, fiz no Jayme da Finte que tem o menor índice de infecção hospitalar do Estado. Não deu outra, em 6 diasestava com o ovo do tamanho de um coco, sofrendo feito um filho da puta e Aureliano não resolvia o problema. Na cirurgia, colocou um dreno que minava secreção o dia todo, e doía prá cacete. Resolvi procurar um amigo que você talvez até conheça. Adailton Vidal conhecido Dadá Caçarola que por muitos anos foi do PCB.
Fui ao Hospital Portugues, ele me examinou e disse que o dreno estava muito em cima dificultando a saída da secreção e teria que abrir um buraco mais embaixo para escoar todo o líquido. Como estava muito infeccionado não tinha como pegar anestesia, salvo RAC, peridural ou geral, o que seria uma merda. Topei fazer a cru e ele passou o bisturi e abriu um buraco de uns 3 ou 4 cm. Doeu prá caralho. Não me urinei , mas as lágrimas Caim de 4 em 4. Fui embora com um monte de medicação. Voltei 3 dias depois e quando tirou o curativo, a porra do talho havia colado iniciando cicatrização.
Abriu de novo e colocou um chumaço da gaze, para não colar de novo. A porra da gase colou e teve que fazer5 uma raspagem 3 dias depois, a cru.
Ele pegou um pedaço de gase com uma pinça e enfiou de um buraco para o outro e puxava para um lado e outro como quem estava engraxando um sapato com flanela. ISSO NO OVO IRMÃO, E A CRU!! Sangrava, doía e eu não sabia o que fazer. Fiz uns 6 curativos destes, todo dia, e não tomava café da manhã (ia em jejum) para não me cagar. Fui contaminado com duas bactérias filhas da puta, PROTEUS MIRABILIS e outra Entero não sei lá o que e me curei com doses cavalares de ciprofloxacina .
Valeu o artigo, irmão !!
Abraços e excelente ano novo
Tenho lido suas lapadas, no JC !
Dr. Marco Albanez, seu artigo, por sinal, muito bem escrito, trata de um dos três maiores descasos por conta dos nossos irresponsáveis governantes. Pena a maioria do nosso povo não percebe.
ResponderExcluirPrezado amigo.
ResponderExcluirSão tantas as notícias de corrupção no nosso país, em diversos setores, que acredito que o Judiciário não tem condições de apurar e julgar todos os casos nos próximos vinte anos. E ainda somos ameaçados pela CPMF. Quem viver, verá.
Forte abraço.
Anselmo Gouveia.
Não gosto de você, mas tenho que reconhecer que a maioria dos artigos que você escreve mexe com a gente. Parabéns.
ResponderExcluirMarco: eu mostrei a turma da Secretria de Saúde o seu artigo. A turma elogiou você, irmão. Abraço e 2016 é o ano da gente. É Bruno na cabeça.
ResponderExcluirMais um artigo bem escrito e bem contextualizado . Marco Albanez como sempre acertando e com textos que dispensam elogios !!!!!
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